sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Sobre pilotar no rípio...


(texto de Mesac Silveira)

Pra quem não sabe, rípio são aquelas pedras soltas que esperam por aqueles que rodam por muitas das estradas da Argentina, Chile, etc.
Escrevo isso no espírito de quem bebe um boa cerveja numa mesa de bar e joga conversa fora sobre viagens. Apenas compartilho uma experiência. E não se trata de conselhos, mas apenas de um relato. Acabei de rodar uns 300 km sobre essas pedrinhas, e ainda há mais uns 300 km pela frente, e resolvi escrever assim no calor da hora.
Primeiro, não sou daqueles que gostam de pilotar no rípio, não extraio nenhum prazer ao fazê-lo. quando ouço as pedras dispararem do chão e baterem no metal embaixo da moto fico p. da vida, e quando, ao passar pelas costelas de vaca, ou sobre pedras maiores, a moto inteira emite um barulho esquisito, eu me arrepio de medo de ficar aqui no meio do nada, a 4000 km de casa. Por outro lado, não seria um ripiozinho que me deixararia longe dessas paisagens que tanto amo. Um dilema. Um dilema resolvido: estou aqui hehe.
Grito pedindo ajuda, e recebo uma mensagem do meu amigo, experiente viajante em moto, endureiro e trilheiro das antigas e das novas: “no rípio, na dúvida acelere”, responde ele. Hehehe, tá que é fácil fazer isso quando o rípio é fofo e você não sabe se vai ser jogado no próximo segundo pra fora da estrada (quer dizer, jogado num rípio ainda mais terrível e fofo)... Dá vontade é de parar, não acelerar hehe.
Acabo de voltar de mais um trechinho de rípio aqui perto, na belíssima região de El Chaltén, Patagônia argentina. E ainda rodei mais um pedacinho pra chegar no meu hotel. E depois disso saí a pé pra caminhar sobre o rípio da estrada. Observá-lo de perto, pegar nele... e, daqui da janela panorâmica no segundo andar do hotel, olho pra estradinha de rípio, e ela me olha, são seis e meia da tarde, e aqui o sol ainda está altíssimo no céu azul. Foi nessas condições climáticas que eu rodei esses últimos dias sobre o rípio da Ruta 40 argentina e, antes, na Carretera Austral chilena. Foram apenas 300 km, mas tinha tempo e rodei sem pressa e prestando atenção. É a segunda vez que piloto no rípio, a primeira foi numa viagem por essas mesmas terras que fiz há trinta anos atrás. Só que há trinta anos anos atrás eu era outro..., jovem, nem me lembro de o rípio ter me assustado, simplesmente eu acelerava e flutuava sobre aquela pedreira toda. Na viagem de agora, me sinto virgem de rípio de novo.
Sim, ficar em pé e acelerar, quer dizer, não é abrir o gás com tudo, mas manter a moto em movimento, tracionada, deve ser isso que meu amigo conselheiro tinha em mente, porque deu certo. Mas, haja joelho de cinquenta e três anos pra aguentar, digamos, sessenta quilômetros em pé naquela trepidação... Então, você dá uma sentadinha e..., bem na hora, o rípio fica fofo. Fofo é maneira de dizer, ele fica hediondo hehe. Ontem eu ia rodando e falando alto dentro do capacete: “descida com curva à frente, rípio numero dois”, “subida aberta à direita à frente, rípio um”. Fui classificando assim o rípio pelo jeitão mais ou menos horrível dele. O nível um é aquele mais fácil, um ripiozinho médio solto sobre uma base de pedra ou areia batida mais ou menos regular. O dois já é pior, o rípio pequeno mistura-se ao médio sobre uma base de rípio pequeno, mas, ainda a base é regular, ou seja, as pedras debaixo estão razoavelmente compridas. Então aparece o terrível rípio três, onde os rípios pequenos e médios se misturam sobre uma camada de rípios pequenos e grandes pouco ou nada comprimidos, aí é F (com F maiúsculo). Ía, como disse, rodando e falando alto, até que não deu mais, a tensão e a atenção eram tão grandes que tive que parar de falar. Porque todos esses tipos de estradas de rípios se alternam de uma hora para a outra. Se no rípio um você, supostamente, poderia descansar um pouco e sentar, no rípio dois se estiver sentado o controle da moto vai ser precário, então, melhor não sentar. Agora se o rípio três aparece numa subida (ou pior, numa descida) mais ou menos íngreme a coisa fica de dar dó. Pra mim apareceu perto de Puerto Natales, no Chile, aí tive que lutar bravamente com a terrível tentação de me sentar e por os pezões no chão e parar a moto. Mas, sei que se fizesse isso talvez nem conseguisse mais arrancar depois. Então me levantei do banco, engatei uma segunda, e acelerei com calma e regularidade, a moto dançou, claro, mas foi em frente. Ufa!
E teve também as rajadas de viento lateral. Ficar em pé na moto oferecia mais superfície para o trabalho do vento. Aí a negociação ficou ainda mais delicada. E tudo isso ainda sujeito à inclinação da estrada, e a trilha deixada pelos carros que você segue. A da direita tendia a me jogar pro rípio fofo que se acumula nos cantos, por isso escolhia a da esquerda, entretanto se a estrada se inclina pra esquerda, dá pra escolher a trilha da direita porque aí normalmente não tem rípio solto nos cantos. Ficar mudando de trilha no meio de um rípio dois ou três é bem arriscado.
Dios mío! São tantos fatores..., e ainda com esses pneus originais, isso sim, com a calibragem ligeiramente mais baixa.
Bem, depois de amanhã tem mais rípio. Que São Pedro (o santo da pedras) me ajude. Um beijo a todos e todas.
Ah sim! Parece que selecionar o modo Enduro faz mesmo diferença.

2 comentários:

  1. Olá, aqui é Bruno, vi seu roteiro até Ushuaia, você poderia me enviar algum contato seu (email) para que eu possa tirar umas duvidas?
    meu email: bmacedonio@gmail.com

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